Por Aderson Bussinger* Fundada em 1969, ainda na ditadura militar, a Empresa Brasileira de Correios-ECT é um patrimônio de todo o povo brasileiro que assegura o serviço postal nos mais de 5500 municípios do País, um feito que não é “qualquer coisa”, em termos de logística, planejamento, recursos físicos e humanos. É esta grandiosa empresa, […]
Por Aderson Bussinger*
Fundada em 1969, ainda na ditadura militar, a Empresa Brasileira de Correios-ECT é um patrimônio de todo o povo brasileiro que assegura o serviço postal nos mais de 5500 municípios do País, um feito que não é “qualquer coisa”, em termos de logística, planejamento, recursos físicos e humanos. É esta grandiosa empresa, estatal, que nos garantiu durante décadas, antes do advento da internet, a parte mais substancial da troca de mensagens por cartas escritas entre brasileiros, dentro e fora do território nacional, bem como a entrega de encomendas, produtos, o que nos faz crer, sem medo de errar, que o Brasil seria muito pior de viver se não fosse a ECT.
Pois bem, são estes trabalhadores, que em sua absoluta modestos pais e mães de famílias, profissionais deste serviço essencial, que estão atualmente em greve, pelo atendimento de reivindicações remuneratórias e sociais, como adicionais de atividade de distribuição e coleta, auxílio de dependentes, reembolso creche, garantia de pagamento durante os afastamentos do INSS, ticket de férias, garantias aos empregados-estudantes, adicional noturno, repouso no domingo, EPIs e outros pedidos, todos absolutamente legítimos e viáveis do ponto de vista legal. Nada que reclamam está fora da ordem jurídica trabalhista brasileira. Nenhum item de sua pauta é irreal, pois sobretudo após a ampliação da terceirização nos Correios, os problemas trabalhistas que já enfrentavam foram agravados mais ainda, como o aumento do adoecimento no trabalho e o assédio.
Evidente, que bem sabem que em uma campanha salarial não conseguirão obter todos os itens reivindicados, o que faz parte da luta trabalhista, mas o que não se pode admitir é que sejam tais reivindicações desconsideradas, sob o pretexto de que estamos vivenciando uma Pandemia, seja porque o Governo atual não valoriza o trabalho, preferindo priorizar a política financeira que favorece aos bancos e grandes conglomerados empresariais privados. O fato de vivermos uma crise sanitária, ao contrário, mais um motivo para que se negocie com os funcionários dos correios, através de suas representações sindicais e federações, o atendimento de seus pleitos, que, inclusive, possuem natureza também sanitária, pois incluem itens relacionados a prevenção de acidentes de trabalho e doenças, sendo, portanto, uma greve também de natureza sanitária, em defesa da vida.
Pessoalmente, fui advogado de sindicato de empregados dos Correios, no Vale do Paraíba, e tenho a absoluta consciência das mazelas que são impostas a estes profissionais, que em expressiva quantidade, são vítimas de doenças profissionais referentes ao carregamento de sacolas pesadas, assédio nos locais de trabalho, jornadas extravagantes, pressão das chefias como da população que, por vezes, também não demonstra-se sensível à situação pela qual passam estes trabalhadores, exigindo-lhes mais do que podem realmente fazer. Tenho, particularmente, um processo no município do Rio de Janeiro em que – pasmem!- um funcionário dos Correios, portador de grave doença, após ser reintegrado pela Justiça do Trabalho, foi obrigado a trabalhar de bicicleta, sem nenhuma condição para isto, nas movimentadas ruas do Rio de janeiro, agravando ainda mais o seu caso. E como este, conheço centenas de outros casos de crueldades praticadas em relação a estes profissionais, o que, inclusive, é objeto de ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em todo o país.
Esta greve, portanto, é justa e pode-se até argumentar que a totalidade da pauta não pode ser atendida, de uma única vez, mas não pode-se deixar de considerar que legítima e merecedora de tratamento sério por parte da direção da empresa e do Governo Bolsonaro. O que difere o pedido de melhoras salariais dos empregados da ECT e pleitos (a maioria atendidos) dos militares das Forças Armadas? Por que os benefícios que requerem seriam menos importantes e oportunos que as reivindicações das denominadas “carreiras de Estado”, se, inclusive, são estes trabalhadores, de fato e de direito, os principais responsáveis pela promoção e efetivação do serviço postal brasileiro, garantido pelo art. 21 da Constituição brasileira, ao lado do Correio Aéreo Nacional?
A greve é legal, constitucional e absolutamente legítima, cabendo, como diz o art. 9 da Constituição Federal, aos trabalhadores decidirem a oportunidade de exercerem este secular direito e os interesses que devam por meio deste defender, o que é exatamente o que estão fazendo neste momento, com razão, os nossos carteiros e demais funcionários técnicos e administrativos do serviço postal brasileiro. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem o dever de buscar a mediação e conciliação desta greve e não tratá-la com desdém ou preconceito, muito menos com ameaça de punições, como infelizmente fizeram alguns de seus ministros, salvo honrosas exceções que dignificam nossa Justiça do Trabalho.
Encerro este breve artigo, manifestando o meu irrestrito apoio a esta greve e exortando a todos que também o façam, pois é um movimento, que, além da importância que possui para estes trabalhadores, é igualmente necessário para o país, a sobrevivência do serviço postal brasileiro, que heroicamente está sendo defendido por estes trabalhadores.
*ADERSON BUSSINGER – Advogado sindical, diretor do Centro de Documentação e Pesquisa da OAB-RJ, conselheiro da OAB-RJ, membro efetivo da CDH, membro do IAB, ABJD e ABRAT (Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas). Colunista e membro do Conselho Editorial do jornal Tribuna da Imprensa Livre, integra a Comissão Nacional eleita de Interlocutores do Fórum Nacional em Defesa da Anistia Constitucional.